
Em 31 de janeiro de 2025, o Senado Federal divulgou o Projeto de Lei (PL) nº 4/2025, propondo mudanças relevantes no Código Civil brasileiro. Com quase 900 alterações e a inserção de 300 novos dispositivos, a proposta busca atualizar diversas áreas do Direito Civil, com destaque para o Direito de Família e o Direito Sucessório. As modificações sugeridas têm potencial para impactar diretamente as relações das pessoas físicas, tornando necessária uma análise criteriosa dos atuais instrumentos de planejamento patrimonial e sucessório.
Contratualização de Questões Sucessórias
O Projeto de Lei permite a formalização de acordos entre herdeiros acerca da disposição e partilha de bens, sem que esses documentos sejam considerados contratos sobre herança de pessoa viva — prática vedada pelo ordenamento jurídico. Além disso, a verificação de eventual nulidade de doações será feita com base no valor nominal do excesso à época da doação, corrigido monetariamente até a data da restituição, e não mais com referência ao falecimento do doador. Essas mudanças buscam aumentar a segurança jurídica entre os envolvidos e reduzir potenciais conflitos familiares no momento da sucessão.
Regime de Bens
A proposta traz inovações significativas quanto à definição e à modificação dos regimes de bens no casamento. Passa a ser permitido aos cônjuges firmar pactos antenupciais tanto antes quanto após o casamento, sem efeitos retroativos. Assim, casais poderão, por exemplo, estabelecer um regime de separação total nos primeiros anos e, posteriormente, alterar para comunhão parcial de bens, sem necessidade de intervenção judicial. Essa maior flexibilidade permite que as regras patrimoniais do casamento sejam adaptadas à realidade e à evolução da relação conjugal.
Pensão Alimentícia Compensatória
O PL introduz a figura dos alimentos compensatórios, voltados ao cônjuge ou companheiro que, em razão do divórcio ou da dissolução da união estável, sofrer uma queda substancial em seu padrão de vida. A inovação supera antigas controvérsias ao permitir que, mesmo em regimes de separação total de bens, o juiz fixe pensão compensatória em favor daquele que dedicou tempo e esforços ao cuidado da família e à manutenção do lar, reconhecendo o valor econômico dessas contribuições invisíveis ao longo da convivência.
Herança Digital
Um dos avanços mais relevantes do PL é o reconhecimento dos bens digitais como parte integrante do patrimônio sucessório. Itens como contas em redes sociais, senhas, arquivos digitais e até criptoativos passam a ser considerados herança. No entanto, visando preservar a privacidade, o acesso a mensagens pessoais e comunicações do falecido dependerá de autorização judicial ou de manifestação expressa deixada em testamento ou declaração de última vontade.
Quem Tem Direito à Herança?
O projeto propõe importantes atualizações na ordem de vocação hereditária. Filhos concebidos por técnicas de reprodução assistida após a morte do genitor (post mortem) passam a ter direito à herança, desde que respeitados os requisitos legais. O PL também prevê a exclusão da sucessão de herdeiros que tenham abandonado ou deixado de prestar assistência ao falecido. Além disso, retira o cônjuge da condição de herdeiro necessário, modificando a ordem de participação na herança e refletindo as transformações nas dinâmicas familiares contemporâneas.
Liberdade do Testador
O novo texto amplia a autonomia do testador na disposição do seu patrimônio. Passa a ser desnecessária a justificativa para imposição de cláusulas restritivas — como inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade — sobre os bens da legítima. Essa mudança confere maior liberdade na organização sucessória e na proteção de determinados bens, de acordo com a vontade do titular do patrimônio.
Agilidade no Processo de Inventário
O PL também propõe medidas para acelerar os trâmites do inventário judicial. O juiz poderá atribuir, de forma mais célere e direta, participações societárias ou imóveis aos herdeiros que já os utilizam ou que são sócios das respectivas empresas. Essa prerrogativa busca reduzir disputas patrimoniais e agilizar a efetiva transmissão dos bens, respeitando critérios de utilidade e afinidade com o patrimônio partilhado.
Necessidade de Revisão dos Planejamentos Patrimoniais
Considerando a amplitude das mudanças previstas, cuja entrada em vigor poderá ocorrer até um ano após a aprovação da lei, torna-se imprescindível que famílias e planejadores jurídicos revisem os instrumentos de planejamento patrimonial e sucessório atualmente vigentes. Essa atualização não apenas garantirá conformidade com a nova legislação, mas também trará maior segurança jurídica e estabilidade nas relações familiares e empresariais.
Adotar uma postura proativa diante das transformações trazidas pelo PL nº 4/2025 será essencial para alinhar os interesses patrimoniais às novas diretrizes do Direito Civil brasileiro, protegendo de forma mais eficiente os direitos dos envolvidos e prevenindo litígios futuros.

