A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que é possível estender o direito real de habitação a herdeiros vulneráveis, com o objetivo de assegurar o direito social à moradia. O entendimento foi firmado ao julgar recurso especial em favor de um homem com esquizofrenia, cuja curatela é exercida por um dos irmãos.

O caso foi considerado excepcional, pois o colegiado aplicou de forma extensiva o artigo 1.831 do Código Civil, que originalmente garante ao cônjuge sobrevivente o direito de permanecer no imóvel destinado à residência da família. A 3ª Turma já possui precedente com o mesmo entendimento.
Pela norma, o direito real de habitação protege o cônjuge viúvo, garantindo que, após o falecimento do parceiro, a partilha de bens não o deixe desabrigado.
Herdeiro vulnerável
O processo analisado tratou da tentativa de aplicar o mesmo direito a um herdeiro — hipótese não prevista expressamente na legislação.
O imóvel em discussão pertencia a um casal que deixou seis filhos, sendo um deles portador de esquizofrenia e sob curatela de um dos irmãos. Ambos residem na casa. A proposta de partilha previa divisão igualitária entre os seis herdeiros, mas com a concessão do direito real de habitação ao irmão vulnerável. As instâncias inferiores, contudo, negaram o pedido.
No recurso ao STJ, o curador argumentou que o benefício deveria ser reconhecido para assegurar a dignidade humana e o direito à moradia do herdeiro em situação de vulnerabilidade.
Direito real de habitação
A ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, destacou que, embora o Código Civil não preveja expressamente a concessão do direito real de habitação a herdeiros vulneráveis, a ausência de norma específica não significa inexistência do próprio direito.
Segundo a ministra, é possível flexibilizar a aplicação da regra, de modo que, quando houver conflito entre o direito à moradia do herdeiro vulnerável e o direito de propriedade dos demais, o juiz deve ponderar os prejuízos e decidir de forma equilibrada.
“Neste específico cenário, o direito à moradia do herdeiro com vulnerabilidade deverá prevalecer sobre o direito à propriedade dos demais”, afirmou a relatora.
Nancy Andrighi ressaltou ainda que todos os herdeiros continuam com a propriedade assegurada, já que o direito real de habitação não a afeta, e que deve ser priorizada a proteção e a dignidade do herdeiro vulnerável.
“Do contrário, se for afastado da residência que compartilhava com o de cujus, poderá enfrentar dificuldades para encontrar nova moradia, em razão de sua condição, que o impede de garantir, por conta própria, sua subsistência”, concluiu.
REsp 2.212.991

